Estereótipos nos apps: eles atrapalham o flerte mais do que você imagina
Deu Match!?
20/06/2018 04h00
Ilustração: Getty Images
O ditado "nunca julgue um livro pela capa" é muito válido, mas pode ser difícil de aplicar quando o assunto é aplicativos de relacionamento. Se tudo o que você tem para avaliar um pretendente são fotos, em geral, é mais fácil se agarrar a estereótipos e experiências anteriores na hora de escolher um par. Infelizmente, por conta desse julgamento, muita gente nem tem a chance de mostrar a que veio.
É o caso do administrador Eduardo Lemes, de 34 anos. Usuário de Tinder e Happn há três meses, ele tem achado difícil encontrar uma moça na mesma sintonia que ele. Eduardo afirma que busca compromisso sério, mas encontra descrença por parte das pretendentes.
"É necessário muito esforço para mostrar que não quero só sexo. Tenho percebido que a maioria dos homens que as mulheres encontram pelos aplicativos estão mais em busca de relacionamento casual, por isso sinto que há a necessidade de provar quero algo diferente. Algumas não acreditam em mim, acham que é parte da cantada", conta ele.
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Já a fotógrafa Maria Veiga, de 25 anos, é o oposto de Eduardo. No momento, ela afirma não querer compromisso, só curtição. Porém, nem todos os contatos dos apps entendem isso. "Acho que acontece pelo fato de eu ser mulher e por eles acharem que as meninas sempre querem ser a princesa sendo salva pelo príncipe. Às vezes, ela só quer mesmo uma noitada boa, né?", diz ela.
Nesses três meses de apps, Eduardo diz que, em muitos casos, as mulheres não dão tanta abertura para um bate papo legal. Ele credita isso à desconfiança das mulheres. Ainda assim, para tentar contornar essa resistência, Eduardo procura ter paciência e investir com calma. "Evito falar dos meus objetivos. Deixo a conversa fluir até a moça com quem estou conversando sentir vontade de passar o contato de WhatsApp, por exemplo", explica.
Maria já é mais direta. Se percebe que o pretendente não está com os mesmos objetivos, já corta logo a conversa. "Não vou ficar perdendo tempo com gente que me julga por não querer nada sério. Não é meu problema se eu não correspondo à imagem que eles acham que eu devo ter. Às vezes, isso cansa".
Nem só de comportamentos se fazem os estereótipos, a imagem também conta. O empresário Jonathan Lima, de 25 anos, tem traços delicados, uma aparência mais jovem do que a idade, e é fã de cosplay, e até mesmo já fez uso das fotos a caráter em seu perfil do Tinder. Por essas características, todos os matches de Jonathan, que é homossexual, se equivocaram quanto a preferência sexual dele.
"Todos com quem dei match acharam que eu era passivo. Todo mundo, mesmo. Quando eu dizia que não era o caso, alguns me deixaram falando sozinho, outros ficavam surpresos e continuaram a conversar, mas apenas na amizade", explica ele.
Por mais diferentes que a situação de Eduardo, Maria e Jonathan sejam, o sentimento de desconforto é o mesmo para os três. "Eu sempre ria e ficava sem graça com essas situações, mas também me sentia meio que rotulado, e isso é uma coisa que sou totalmente contra. As pessoas precisam se desprender desse tipo de condicionamento mental", afirma Jonathan.
Há vida fora do app
De acordo com a psicóloga Elaine Santos, doutoranda em relações tecnológicas pela USP, essas situações apenas refletem a cultura atual de relacionamentos.
"Esse tipo de comportamento é um reflexo da nossa sociedade: a questão é que esses apps e redes de relacionamento acabam evidenciando isso. Cada vez mais as pessoas têm valorizado aspectos relacionados a imagem e aparência, assim como uma busca de um reconhecimento de si mesma nas relações, e não do outro. Assim, a gente acaba esquecendo de considerar aspectos fundamentais e que vão muito além de uma foto ou uma simples descrição do perfil", conta ela.
Para lidar com esse ambiente passível de frustração, a dica principal é não apostar apenas no contato raso com o outro. "Um primeiro ponto é entender que no mundo virtual tudo é pautado pela lógica da instantaneidade, da imediaticidade. Esses apps nunca serão um ambiente que valorizam o indivíduo pelo o que ele é, mas sim pelo o que ele aparenta ser. A nossa identidade virtual é muito mais empobrecida do que a nossa identidade real, por isso, os aplicativos devem ser apenas uma possibilidade para conhecer pessoas, entre tantas outras que existem. É preciso tomar o cuidado de não esquecer que uma relação precisa levar em consideração outros aspectos que não só a imagem para se fortalecer", finaliza Elaine.
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