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Deu Match!?

Gays falam sobre homens heterossexuais que os procuram em apps de pegação

Deu Match!?

14/04/2019 04h00

Dentro da enorme gama de possibilidades de encontros que os apps de relacionamento oferecem, uma delas é pouco abordada: a questão dos homens que se identificam como heterossexuais, mas usam o app em busca de sexo casual com outros homens. São pais de família, homens comprometidos, casados, solteiros, alguns machistas, outros descolados… E caras que não pensam em sair do armário e que não consideram que transar com outro homem os transforma em homossexuais.

O advogado Alexandre Oliveira vê os apps como um facilitador para esses homens. Crédito: arquivo pessoal

"Já saí com héteros e homens casados. Alguns eram sinceros, outros, não"

Alexandre Garcia de Oliveira, 32, conta já ter se relacionado com homens com esse perfil. Para o advogado, que é gay assumido –assim como os outros entrevistados deste texto– muitas dessas pessoas usam o aplicativo porque têm medo de encarar a sociedade e assumir seus desejos.

"Já estive com pessoas que falaram 'estou a fim de experimentar, nunca fiz' e na hora H, sendo ativo ou passivo, mandou superbem, o que deixava claro que aquela não era a primeira experiência dele. Outros com quem saí diziam 'ah, é só sexo, marcamos um outro dia' e depois do futebol com os amigos passavam na minha casa".

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Comprometido há dois meses, Alexandre diz que, quando era solteiro, precisou lembrar a alguns desses homens que insistiam em manter algo casual que eles eram casados e que, portanto, era melhor pôr um ponto final na história.

"Todas essas histórias começaram nos aplicativos, muito mais nos apps gays, e até no Instagram. Onde podem puxar assunto, eles vão. O cara vem dizendo 'ah, não sou assumido' e aí depois desenrola a história e vem com o papo 'estou afim de arrumar um relacionamento extraconjugal', 'vamos marcar de ir nos vendo', outros só querem nudes ou saber até onde você vai."

O cabeleireiro Fernando Armelline afirma que esses homens procuram gays para satisfazer desejos sexuais reprimidos

"Entendi que esses caras não são hetero de forma alguma"

O cabeleireiro Fernando de Almeida Armelline, 29, é mais direto ao relatar as experiências que teve. Ele e o companheiro, com quem está junto há quatro anos, recorrem aos apps de relacionamento para procurar outros caras. "Muitos procuram homossexuais para satisfazer o desejo por sexo anal, que, segundo eles, as mulheres não fazem. Uns criam perfil sem mostrar o rosto, outros  junto com namoradas, mulheres ou amigas", conta.

"Aconteceu de um casal heterossexual que nos procurou porque era desejo da esposa, um lance de voyeur mesmo, ver o marido com outro homem. De início eu não queria, pois ia ter uma mulher entre nós, e achei que não me sentiria confortável com a situação. Acabei topando. Chegando lá percebi que a vontade de estar ali não era da mulher, mas, sim, do cara. Ele curtia mesmo ser passivo".

Depois dessa experiência, que terminou com o homem entrando em contato para se encontrar com o casal gay, sem a presença da esposa, Armelline concluiu que essa pessoa vivia um casamento de fachada, assim como outros que conheceu na ferramenta. "Muitos desses homens, além de usarem apps de relacionamento, procuram saunas e clubes de swing. Nós frequentamos esses locais e tem muitos que se dizem heterossexuais ali".

O artista William Cury diz já ter se relacionado com homens heterossexuais e machistas. Crédito: arquivo pessoal

"Nunca tive medo da mulher de um deles vir até mim"

William Cury, 24, vê nas relações que homens casados estabelecem com gays algo parecido com aqueles que buscam mulheres para serem suas amantes. "Se avaliar bem o cara tem uma família, mulher, filhos. É a mesma coisa, no sentido de ter alguém para satisfazer o desejo sexual dele. Se for uma travesti ou trans feminina, é provável que esse hétero se sinta muito à vontade, porque na cabeça dele será uma relação com uma mulher na qual ele terá a liberdade de realizar seus desejos", acredita ele.

"Tinha 18 anos e encontrei o Pedro* — que tinha uns 42 — no app e já foi rolando sexo. Ficamos quatro anos assim, nos relacionando de forma casual. Aos poucos fui descobrindo a sua história, que era casado e tinha dois filhos. Muitas vezes nos encontramos na casa dele e a mulher estava no andar de cima. Nunca perguntei diretamente se ela sabia, mas ele dava vários indícios — como a precaução para que ela não nos visse juntos — de que a esposa dele não imaginava essa situação".

O artista conta que circunstâncias como essa são comuns. "Em outra ocasião, conversei com um rapaz no app e quando chegou no apartamento dele fomos para um quartinho. Perguntei se alguém mais estava lá e ele respondeu que a mulher estava dormindo e pediu para termos cuidado para não acordá-la. Depois que rolou, mandou uma mensagem dizendo 'tchau, obrigado. Até mais' e me bloqueou".

Cury afirma que é tão comum homens que saem com outros homens e não se identificam como gays que até foi criado um termo para esse tipo de relação: brotheragem. A expressão, que vem do inglês e foi abrasileirada, se refere a um relacionamento íntimo, sexual ou não, entre dois homens. Há casos em que não há penetração, apenas sexo oral, dormir de conchinha ou coisas do tipo.

"Atualmente não rola mais com o Pedro. Naquela época era uma aventura. O mundo gay é muito colocado nessa situação, que é um meio fácil de conseguir sexo e vamos preenchendo todas as lacunas de nossa vida com isso. Já senti tristeza por eles, já os olhei com raiva, mas, hoje, tenho consciência que eles aceitaram a condição em que vivem. Em vez de olhar e pensar que quanto mais velhos, mais donos de si, eles estão totalmente ao léu com o que acontece com a própria vida. É como se dissessem 'eu tenho uma família, abdicar de tudo agora vai dar muito trabalho. Deixa assim mesmo'".

* Identidade preservada a pedido do entrevistado

Por Eligia Aquino Cesar, colaboração para a Universa

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